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Os Meus Nobel

Aqui encontra informação sobre a vida e a obra de grandes escritores, galardoados com o Prémio Nobel de Literatura ou não, minhas recensões de livros, textos de minha autoria e notícias literárias

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O Vermelho e o Negro

Vibarao, 16.09.25

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"O Vermelho e o Negro" de Stendhal

"O Vermelho e o Negro" ("Le Rouge et le Noir"), publicado em 1830, é uma das obras mais emblemáticas do escritor francês Stendhal, pseudónimo de Henri-Marie Beyle. Este romance, situado na França pós-napoleónica, destaca-se pela análise psicológica profunda das personagens e pelo retrato crítico da sociedade da época.

A narrativa centra-se em Julien Sorel, um jovem ambicioso, filho de um carpinteiro, que procura ascender socialmente através do talento, da inteligência e de uma certa frieza calculista. Embora haja outras opiniões, a explicação mais coerente para o título do romance é o dilema de Julien Sorel, dividido entre a carreira militar (o vermelho) e o caminho eclesiástico (o negro); o personagem luta entre paixão, ambição e moralidade. O romance acompanha a trajetória de Sorel, desde o pequeno vilarejo de Verrières até aos salões aristocráticos de Paris, explorando as oportunidades e as armadilhas que o destino lhe reserva.

Julien Sorel é uma das personagens mais complexas da literatura francesa. O seu carácter oscilante, entre a ingenuidade e o cinismo, entre o idealismo romântico e o pragmatismo frio e calculista, torna-o fascinante e imprevisível. Acredita que, dada a sua origem, só pode ascender socialmente através da carreira eclesiástica; mas não desdenha o apoio da alta burguesia e da nobreza para conseguir atingir os seus fins. Outra personagem central do romance é Madame de Rênal, a senhora de idade madura e primeira amante de Sorel, que simboliza a inocência e a culpa burguesa; Matilde de La Mole, a jovem e segunda amante de Sorel, representa o orgulho aristocrático e a rebeldia juvenil. Este triângulo amoroso é o reflexo dos conflitos sociais e políticos da época, dividida entre os revolucionários e os conservadores, entre os apoiantes da República e os apoiantes da Monarquia.

Stendhal utiliza "O Vermelho e o Negro" para criticar a hipocrisia, a corrupção e o conservadorismo da sociedade francesa do início do século XIX. A oposição entre o vermelho e o negro remete para a tensão entre o mundo militar e o religioso, entre o povo e a nobreza, mas também representa os dilemas internos de Julien. O estilo de Stendhal é direto, irónico e muitas vezes introspetivo, com uma notável capacidade para analisar as motivações e os sentimentos das suas personagens. O autor recorre com frequência ao monólogo interior, antecipando técnicas que viriam a ser exploradas por outros autores no século XX.

"O Vermelho e o Negro" é considerado um dos primeiros romances psicológicos da literatura europeia, que influenciou autores como Flaubert, Dostoiévski e Proust, por exemplo. Para além da crítica social, Stendhal oferece uma reflexão intemporal sobre as ambições humanas e o preço a pagar quando se quer agir de acordo com as suas convicções num mundo regido por convenções de carácter religioso, social e político, quantas vezes a ter de escolher entre a vida e a morte.

Há no romance muito de carácter autobiográfico. Stendhal ousa espelhar em Julien Sorel muito de si próprio, nomeadamente a sua dificuldade em manter relações amorosas duradouras e, de modo especial, a coragem de ser um bonapartista quando o regime de Napoleão tinha caído e a monarquia havia sido restaurada, o que lhe valeu um longo exílio em Itália.

Em resumo: ler "O Vermelho e o Negro" é entrar num universo onde a paixão se entrelaça com a política, e onde cada escolha tem consequências profundas. Stendhal convida o leitor a questionar as motivações pessoais e os valores sociais, numa escrita que permanece atual, vibrante e provocadora, dois séculos depois de ser escrita. Esta obra-prima é indispensável para quem deseja conhecer a literatura francesa, mas também para quem procura compreender a complexidade da alma humana.

 

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