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Os Meus Nobel

Aqui encontra informação sobre a vida e a obra de grandes escritores, galardoados com o Prémio Nobel de Literatura ou não, minhas recensões de livros, textos de minha autoria e notícias literárias

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Meia-Noite ou O Princípio do Mundo

Vibarao, 29.09.22

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Comentário ao livro “Meia-Noite ou O Princípio do Mundo” de Richard Zimler

Apesar deste ser o terceiro volume do “Ciclo Sefardita” sobre a família Zarco, iniciado com “O Último Cabalista de Lisboa” e continuado com “Goa ou o Guardião da Aurora”, cujos comentários já aqui deixei, “Meia-Noite ou o Princípio do Mundo” foi o primeiro livro da saga que li, já há muitos anos. Mas este facto não retirou o mínimo interesse à leitura, porque todos são histórias independentes passadas em diferentes épocas da História. Na verdade, foi um prazer ler este volumoso volume, que prendeu a minha atenção desde o início até ao fim.

Como é habitual nos livros desta saga, é uma história muito bem construída e enquadrada nos acontecimentos históricos da época: as lutas entre absolutistas e liberais, as invasões francesas, os saudosistas da Inquisição e a semiclandestinidade dos Judeus e cristãos-novos, o desenvolvimento da Companhia das Vinhas do Alto Douro, a resistência dos interesses económicos ao fim da escravatura e a desumana situação dos escravos negros nos estados do sul dos E.U.A.

As personagens centrais de “Meia-Noite ou o Princípio do Mundo” são John Zarco Stewart e Midnight. John é um branco meio-escocês, meio-judeu e Meia-Noite é um escravo que o pai de John, um britânico negociante de vinhos, trouxe dos Estados Unidos numa das suas viagens de negócios. Nessa altura, já não havia escravatura na Europa, mas continuava a existir nos E.U.A. Meia-Noite era um feiticeiro boximane que tinha sido capturado e vendido como escravo. A criança John começou por achar muita curiosidade pelo negro, que tinha uma extraordinária habilidade para caçar. Meia-Noite fazia as suas próprias setas e caçavam nos arredores do Porto, como se estivessem nas savanas africanas. Com o tempo, foram-se afeiçoando mutuamente, tendo o velho africano se tornado mais do que um pai para ele.

Os anos passaram e tudo se complicou, a ponto de Meia-Noite voltar para a América e tornar a ser escravo, o que foi escondido a John até ele ser adulto. A sua vida passou por muitas vicissitudes, como o seu pai morrer vítima da guerra contra os franceses invasores, casar, ter filhos e enviuvar. Veio também a tomar conhecimento de que é o herdeiro de um manuscrito secreto que tem passado de geração em geração na sua família, do qual passou a ser o guardião. Mas a verdade dos acontecimentos chegou ao seu conhecimento. John Zarco Stewart acaba por saber o que aconteceu a Meia-Noite através de umas cartas antigas e resolve atravessar o Atlântico em busca do seu amigo. Será que ainda está vivo, que vai conseguir encontrá-lo e obter o seu resgate?

As personagens estão muito bem construídas, a trama desenvolve-se a um ritmo alucinante no ambiente difícil daquele início do século XIX.  Richard Zimler demonstra claramente que não é a cor da pele, a raça ou a religião que definem o carácter e as capacidades das pessoas. A amizade, digo, o amor, entre John (o branco meio-escocês, meio-judeu) e Meia-noite (o feiticeiro boximane) é de um encanto e de uma ternura que comovem os corações mais duros. Os usos e as tradições de cada um não os tornam melhores ou piores, mas diferente e merecedores de ser respeitados e compreendidos.

Um livro espantoso e emocionante que não esqueci desde a sua leitura há mais de dez anos e aconselho vivamente.

Esta recensão atualiza e amplia o comentário publicado no Segredo dos Livros em 29 de junho de 2010.

 

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