Kyoto
Comentário ao livro “KYOTO” de Yasunari Kawabata
Sem desprimor para as restantes obras, esta é justamente considerada a obra-prima de Yasunari Kawabata. Este romance tem tudo o que a sua escrita tem de melhor: o conhecimento perfeito da psicologia feminina, a simplicidade e subtileza da escrita, a elegância de estilo e a prodigiosa imaginação.
Kyoto fala do modo de vida no Japão, das suas casas com paredes de papel pintado e portas de correr; fala do vestuário tradicional, fala do kimono e do obi (a longa faixa que é atada à volta da cintura para manter as duas abas do kimono presas ao corpo e este não se abrir); fala dos gostos e da maneira de ser e de estar, das vénias e dos olhares; fala das cerimónias do chá ritual, como é feito, como é servido, como deve atuar quem serve e quem é servido, como se deve segurar a chávena. Tudo isto como pano de fundo de uma história muito terna, onde o amor está sempre presente.
O romance conta a história de duas irmãs gémeas, cada uma das quais ignorava a existência da outra. Filhas de um casal pobre, uma delas foi enjeitada pelos pais, não só porque não tinham recursos para criar dois bebés ao mesmo tempo, mas também porque era considerado de mau agoiro ter gémeos. Foi recolhida por um casal de ricos comerciantes de tecidos, que lhe chamaram Chieko e a criaram com todo o carinho, com requintada educação e nada lhe faltava. A outra irmã, Naeko, foi criada pelos pais pobres e camponeses, que se dedicavam ao corte, descasque e polimento dos troncos de cedros, cuja madeira era famosa na região de Kioto. Era destemida e forte, mas pouco culta e vestia pobremente.
Um jovem tecelão, filho de uma família pobre que tecia para os pais de Chieko, encontrou Naeko no arraial da festa mais importante do ano, abordou-a e pensou estar a falar com Chieko. Era amigo de Chieko desde crianças que amava em segredo, mas os pais queriam casá-la com o filho de outro rico comerciante. Naeko disfarçou e não deu seguimento à conversa, o que o deixou triste e levou a confrontar Chieko. Na sequência desde acaso, Chieko pensou que só podia ser uma sua irmã gémea. O leitor virá depois a saber como elas se conheceram e se relacionaram; como os pais de Chieko, depois de conhecerem Naeko, facilitaram a aproximação entre as duas e se propuseram adotá-la também. Para ela era tentador subir na vida, passar a vestir bem, a não ter falta de nada, conseguir talvez um bom casamento. Será que vai aceitar?
Como já disse, está bem patente neste romance o estilo de escrita de Yasunari Kawabata, que se distingue por uma linguagem suave, mais abstrata do que descritiva, onde predomina a subjetividade em relação à objetividade, aproximando-se muitas vezes da prosa poética. Um livro curto, sem floreados desnecessários, que se lê com muito prazer.